Humildade nunca fez mal a ninguém
Um banho de humildade nunca fez mal a ninguém. Bem pelo contrário. E regressar à Terra tem sempre efeitos benéficos, sobretudo quando andamos demasiadas vezes nas nuvens.
É certo que a nação leonina vive há muito traumatizada com o travo excessivo de amarguras e desilusões, sendo por isso enorme a ânsia de vitórias e momentos gloriosos. E também por isso a adesão a esta recente onda de entusiasmo e optimismo, alimentada por contratações em catadupa, é por si só um fenómeno natural e perfeitamente legítimo por parte de quem tanto gosta e vibra com o Sporting. Ao contrário de alguns puristas não vejo mal nenhum nisso. Mas...
Mas ontem veio o balde de água fria. Aliás, gélida.
E veio em boa hora, porque se há momentos de uma época onde se pode falhar e corrigir é precisamente agora. Na pré-época.
O plantel foi profundamente remodelado, alguns elementos que transitam estão a ser 'recauchutados', a equipa técnica é nova, há novos métodos de trabalho, nova filosofia, novos processos e outros mecanismos que carecem de ser assimilados. E como sabemos, nada disso acontece de um dia para o outro, nem por milagre. Como diria Octávio Machado: 'é preciso trabalho, muito trabalho'.
É perfeitamente aceitável que quase 50.000 espectadores e uma onda de entusiasmo e alegria que varreu as bancadas de Alvalade esperassem e merecessem um resultado positivo no jogo de ontem com o Valencia. Mas também é verdade que o adversário da noite passada não era um qualquer. Estávamos na presença 'apenas' da terceira potência futebolística da última década da muito competitiva liga espanhola, um emblema que tenta ombrear com os colossais Barcelona e Real.
A verdade é que se queremos resultados garantidamente positivos em jogos de apresentação, goleadas antes de tempo, então talvez devamos optar por convidar o Merelinense ou o Casa Pia, pese embora o respeito que esses clubes me merecem.
O jogo de ontem terminou 0-3, e se calhar ainda bem. Porque não somos tão bons como a vitória categórica frente à Juventus poderia fazer supôr, mas porque também não somos tão medíocres e pernas de pau como agora alguns pensam, sobretudo aqueles que já ameaçam devolver a gamebox e nunca mais voltar a Alvalade. Há ainda muito a fazer e o alarme de ontem significa isso mesmo.
É também muito pedagógico que chegue nesta altura um banho de humildade e um certo travão a excessos, até para que alguns responsáveis possam repensar certas afirmações, traduzidas em despropositada gabarolice. É aconselhável que pessoas com responsabilidade - como Carlos Barbosa - entendam quão perigoso e contraproducente pode ser afirmar que estamos, ou em breve estaremos, no mesmo patamar de Real Madrid ou Barcelona.
Num clube onde o bipolarismo grassa em significativas franjas da massa adepta e onde 'paciência' apenas existe no apelido do treinador, há que reiterar que é preciso dar tempo e que ainda há muito trabalho por realizar.
Temos que ser pacientes, deixando que as jovens apostas amadureçam (Rubio, Carrillo, Arias, Turan, Wolfswinkel...) e que valores mais experientes e seguros mostrem o seu real valor (Rinaudo, Schaars, Onyewu...), para que então possamos ter um conjunto forte, capaz de inequivocamente ombrear com os nossos directos rivais.
Precisamos que o plantel, fruto de muito trabalho, seja competente para que nos possa oferecer as alegrias que todos merecemos e que há muito tempo nos fogem.
And last but not the least: é fundamental que o saudável entusiasmo dos adeptos agora não esmoreça - com uma simples, embora pesada derrota - porque como alguém dizia não há campeões sem apoio vindo das bancadas.
Façamos a nossa avaliação e respectivos juízos de valor no final da época. Não no início.
Nuno M Almeida
(não se presta um bom serviço ao clube nem ao próprio Bruno Carvalho, invocando o nome deste e pedindo o seu regresso a cada desaire da nossa equipa. Será uma atitude abjecta, desprezível, nojenta mesmo, por parte de abutres alarves que constantemente pairam sobre Alvalade e que de sportinguistas nada mostram ter.)